Atrasado como sempre, finalmente tentei assistir a temporada nova de The Boys. Devo ter sido a última pessoa (risos) e pra ser sincero, prefiro assim. É sempre melhor falar de algo depois que o hype passou.

A primeira e a segunda temporadas eu assisti meio que de uma vez só, num ritmo frenético, quase initerruptamente. A terceira... Vou falar a verdade: ainda nem terminei.
E não quero entrar aqui no mérito da qualidade da série, da narrativa, da estética, do roteiro, do ritmo, de nada. Esse texto é sobre super-heróis. Mais especificamente, sobre "Supermen do Mal".

Há um tempo, vagueando pela internet, eu me deparei com um tweet mais ou menos assim: "hoje em dia é impossível você dar dois passos sem tropeçar num Superman do Mal".
Na hora eu pensei: "Nossa, real". Agora, rapidinho, de cabeça, eu consigo citar pelo menos uns 5 que vi recentemente. O Omniman, o Superman de Entre a Foice e o Martelo (que li há um tempo, mas assisti a animação mês passado), o Superman de Injustice - game de sucesso da última década -, (mais uma vez ele) o Superman do sonho do Batman em algum dos filmes da DC, o próprio Capitão Pátria, antagonista da série em pauta, e tenho certeza que você conhece mais alguns.
Consigo lembrar também de uma coisa que me chamou atenção no fiasco chamado Esquadrão Suicida, de 2016. Foi uma frase da Amanda Waller (Viola Davis), que era algo próximo a "E se o Superman resolver destruir a cidade? Quem irá impedir?"
Não sei se já ficou claro aqui, mas me parece que essa figura é recorrente de uns tempos pra cá. E a que se deve?

Talvez Jung explique.

Carl Jung foi um psiquiatra, estudioso da psicanálise e fundador da Psicologia Analítica, e um dos conceitos elaborados por ele era o de inconsciente coletivo. Antes de falar deste propriamente, talvez fosse melhor explicar o que é o inconsciente Junguiano, então lá vai:
Segundo Carl (para os íntimos) o inconsciente abarca toda informação que nós temos na mente mas que não estamos acessando no momento. Por exemplo, imagine que sua mente é uma cidade, que você está numa rua e que um carro é uma informação. Você está olhando para um carro específico, que passa por você. Nesse momento ele está na consciência. Quando ele virar na esquina vai ter saído do seu campo de visão, mas não deixará de existir, só continuará andando pelo resto da cidade. O resto da cidade, que segue acontecendo longe dessa rua e, consequentemente, longe dos seus olhos, é o inconsciente. Ainda para o Carl (meu brother), algumas informações são elucidadas, debatidas e talvez até refinadas na inconsciência. Exemplo, aquele carro voltando na rua em questão, mas agora rebaixado e com vidro fumê. Inclusive, Jung analisava sonhos como se estes fossem possíveis anúncios do inconsciente - não só eles, como também a intuição -, meio pelo qual você entra em contato com ideias trabalhadas por você mesmo longe da sua consciência.
E o inconsciente coletivo?
Pega isso que eu te expliquei e leva pra uma escala maior kkkkkkk

Brincadeiras à parte, existem sim especificidades do inconsciente coletivos, mas isso é conversa pra depois. Não cabe aqui. O que nos interessa dessa explicação toda é:
Parece que enquanto sociedade, percebemos algo inconscientemente. E o que seria? Percebemos que Supermen (ou Supermans kkkk) são uma má ideia.
Acho que o Super-Homem é o esteriótipo básico do super-herói. Roupa azul, capa vermelha, cueca por cima da calma. Se ele não é o primeiro em quem se pensa quando dizemos "herói", com certeza é um dos primeiros. É algo como a representação do que um herói deveria ser. Só que agora, pra gente, parece que é questão de tempo até ele se tornar alguém ruim. Nas narrativas atuais, isso aparece sempre como algo - se não inevitável - bem possível. E como não seria? Acreditar que alguém com tanto poder só pra si vai sempre usá-lo para o bem me parece bem mais difícil, embora tenhamos acreditado nisso (sendo bem otimista na estimativa) durante todo o século passado.
Parece que a história nos mostrou outra coisa. Se não a história, algo mostrou, e se não sabemos ainda, nosso inconsciente já percebeu, já que pra Jung, as historinhas, narrativas, mitos ou como queira chamar, nada mais são que projeções desse inconsciente.

~ [Alerta de spoiler: Inclusive no gibi (The Boys, do Garth Ennis) o Billy, que está desde o início tentando derrotar o Capitão Pátria, precisa adquirir poderes pra conseguir bater de frente com o antagonista, mas depois que adquiri, se torna também um Superman do Mal, passando assim a ser o "vilão" que precisa ser detido. Não sei se na série também vai acontecer.] ~

O que o consciente não sabe, nosso inconsciente narra. E por que eu acho que não sabemos conscientemente? Por causa das últimas eleições. Não devo ser só eu que estou vendo há anos candidatos a cargos políticos (que em tese deveriam ser funcionários do povo e prestar contas a ele) sendo elevados ao lugar de mitos, super-heróis prontos para salvar o mundo de todo mal.

E veja, isso não é uma ode à desesperança. Devo ser uma das pessoas mais esperançosas que eu conheço. Mas tenho esperanças pautadas na realidade, e a realidade que nossas historinhas vêm denunciando é que "Supermans" são, no mínimo, uma ideia perigosa.