Ator pornô revela burnout ao gravar filmes adultos: "Me dava ansiedade"

Por Revista GQ 03/06/2025 15h03
Por Revista GQ 03/06/2025 15h03
Ator pornô revela burnout ao gravar filmes adultos: 'Me dava ansiedade'
Ator pornô - Foto: Reprodução

Em uma sala com luzes piscantes, decorada com um pole dance e uma cama redonda, Arthur Velvet, 31, começou uma vida nova. O ano era 2019. Desde a adolescência, entendia-se bissexual. Também sentia-se atraído ao ser assistido enquanto transava com quem quisesse apreciá-lo em suas aventuras e desejos. Em casas de swing em Moema, zona sul de São Paulo, uma atriz o convidou para estrear como ator em um filme pornô.


O convite marcava a fase da euforia e também do desencanto. Na época, ele tinha 23 anos e uma agenda dupla. Na semana, trabalhava com marketing e comércio exterior. Era formado em filosofia e sociologia nos Estados Unidos, mas não gostava do desfecho profissional conquistado devido ao esforço na vida acadêmica.

À frente do computador, preenchia planilhas, fazia vendas, era convidado a “reuniões que poderiam ser um e-mail”. A pressão aumentava e piorava. Foi quando sentiu os primeiros tremores de um burnout, uma exaustão psicológica e física associado ao trabalho.



“Trabalhar das nove às seis? Com duas horas no trânsito? Isso ia ser minha vida?”, diz à GQ Brasil. “Eu sou muito gostoso para passar por isso”.



A primeira produção foi de graça, sem cachê. E ele nem queria receber pelo trabalho. “Eu fui por exibicionismo”, diz. Arthur usou o próprio nome, não escondeu o rosto e em troca conquistou milhões de visualizações em sites adultos. Um sucesso, mas um sucesso silencioso.



Quando retomava para a rotina no trabalho, sentia os sorrisos de canto de boca dos colegas que o assistiam na surdina. Enquanto isso, ele desejava mudar de emprego.

Na época, o OnlyFans passava de 13 para 305 milhões de usuários entre 2019 e 2023, segundo o Statisa. Hoje, movimenta mais de 1 bilhão de dólares. A proposta é diferente: uma pessoa comum, com um trabalho comum, poderia se tornar uma estrela independente. Era o sonho de Arthur e também atalho para pedir as contas e viver sua verdadeira aptidão.



“Um ator pornô ganha entre R$ 250 a R$ 500 por filme. Em uma produção grande, no máximo R$ 1 mil. As mulheres ganham, pelo menos, o dobro”, diz. Apenas o OnlyFans garante cerca de R$ 10 mil mensais dos assinantes, o suficiente para ter uma vida considerada confortável.



Uma cena com no máximo 30 minutos pode tomar o dia inteiro entre cenografia, iluminação, maquiagem e, evidentemente, exige um ator à disposição.



No caso de Arthur, isso significa cerca de 4 gravações por semana. Já a produção para o OnlyFans e redes sociais é constante, com centenas de vídeos e fotografias armazenadas na memória do celular onde as filma.



Em parte, também é um trabalho com pressões. Um ator inseguro (com problemas de ereção) pode colocar a produção abaixo. Pior ainda, manchar a própria reputação e perder ofertas de mais cenas. “Posso te dizer que você precisa tirar tesão de onde conseguir”, diz. “Caso não consiga um dia, é quase de lei ter que tomar tadalafila”, medicamento usado usado para provocar ereções.



Arthur recebe ofertas para ser amarrado por cordas (o chamado shibar), orgias, cenas com pessoas cisgênero ou trans e, na mais rotineira, o sexo um a um com uma mulher. “É uma coisa profissional. Ninguém fica se encostando ou beijando depois”, diz ele. Os exames médicos para ISTs são uma obrigatoriedade, salienta, e uma condição incontornável no meio.



Tudo isso forma um ciclo: os filmes dirigidos por produtoras pornô lhe dão reconhecimento e portfólio. A visibilidade é direcionada para os conteúdos próprios. Isso significa estabilidade financeira, mas também ter a sexualidade, antes reclusa às casas de swing, exposta a milhares e milhares de pessoas.



Em um ritmo frenético quase diário, a divisão entre vida pessoal e profissional tornou-se traiçoeira.

“Às vezes, estou transando com alguém que tenho uma relação amorosa e percebo que estou fazendo uma performance para uma câmera invisível”, desabafa. A atenção na nova carreira remeteu à pressão corporativa.



“Teve um tempo que perdi a libido. Estava desesperado só de pensar em fazer sexo. Eu estava tendo um burnout do pornô. Tinha deixado de ser prazeroso. Pensava: ‘vou ter que gravar, vou ter que gravar, vou ter que gravar’. Só de pensar em sexo, me dava crises de ansiedade”, diz.



Arthur se submeteu a sessões de terapia. “Era muito difícil desligar o modo pornô em mim”, explica. “Muitos atores entraram no pornô após serem escalados. Eu, não. Entrei porque já transava muito e escolhi isso. A maioria dos atores nunca cansou de transar. Eu, não. Eu cansei”, diz.



Nessa altura, ele já havia deixado de namorar e até ter encontros com pessoas de fora da cena pornô. Era a maneira para encurtar caminho e evitar explicações maiores sobre como ganhava a vida, o que inevitavelmente reduz as possibilidades de distração. Os amigos da rede de apoio eram todos do mesmo universo. Ele decidiu uma saída temporária.



“Fiquei mais de um mês sem gravar, o que é muito para mim. Sem gravar, eu não ganho nada”, diz. Um psiquiatra o ajudou a controlar os remédios contra ansiedade. Na análise, passou a se entender melhor. “No momento, me sinto em equilíbrio. Mas é um processo para não pender para nenhum extremo”.



Ele não se ilude. Sabe que atua em vídeos que dificilmente sairão da rede. Ou seja, que vai enfrentar a mesma dificuldade encontrada por incontáveis outros atores que abandonaram a vida no mercado pornográfico para retomar a discrição. E nem ele quer. Os amigos, os amores, foram encontrados nessa nova vida. Em breve, pretende buscar uma nova formação, agora para um campo que realmente deseja.



“Eu quero fazer psicologia para trabalhar com sex workers. É uma classe que acaba sendo muito marginalizada e com preconceito”, diz. “Toda minha rede de apoio é de gente do meio. Antes, eu achava que era uma figura fadada a ficar sozinha de tudo por conta da minha sexualidade."