Menores desdenham da educação e dizem ganhar mais do que médico vendendo curso para ser influencer
"Qual faculdade você pensa em fazer no futuro? Faculdade? Eu já ganho mais que 5 médicos no mês".
"Não me garanto em muita coisa, mas coloca um celular na minha mão pra ver se eu não faço R$ 50 mil no mês".
Frases como essas são ditas por adolescentes em vídeos publicados em contas com milhares de seguidores no Instagram e no TikTok.
O conteúdo delas se resume a postagens que minimizam a importância do estudo e onde os "influencers mirins" vendem a ideia de um trabalho fácil, mostram maços de dinheiro, citam altas cifras de faturamento na bio, mas não revelam a fonte da suposta riqueza.
Eles pedem que os interessados em saber a "receita" do sucesso mandem uma DM (mensagem privada) ou acessem um link. Ali é revelado que o caminho para "ter" uma vida como a deles começa por comprar um curso hospedado nas plataformas de marketing de afiliados Kiwify e Cakto, amplamente divulgadas pelos adolescentes.
O que é marketing de afiliados: é uma estratégia de vendas em que uma empresa ou pessoa (também conhecida como infoprodutor) cria e disponibiliza seu curso ou produto em plataformas dedicadas para isso. Outras pessoas, então, divulgam esses conteúdos com links exclusivos e ganham uma porcentagem em cima da venda delas.
Quem são os influencers que ostentam
Apesar de serem desinibidas para falar sobre uma suposta vida de luxo, as crianças revelam poucas informações pessoais. Não falam as idades, nem a cidade ou estado onde vivem.
Os perfis costumam se seguir, o que indica que os envolvidos se conhecem, ao menos no ambiente virtual.
As informações disponíveis nas contas seguem a mesma tática dos vídeos: na bio, elas citam o suposto faturamento do influencer e incitam os seguidores a procurá-las se quiserem ter a mesma vida.
Em alguns poucos vídeos, crianças e adolescentes dizem estar com o pai ou a mãe e até presenteiam familiares. Nas filmagens, os supostos responsáveis sempre demonstram surpresa com o trabalho altamente rentável do filho.
O g1 localizou os pais de uma menina de Minas Gerais que divulga esses cursos. No Instagram, ela tem mais de 230 mil seguidores e os vídeos publicados contam com milhares de visualizações.
O pai dela inicialmente demonstrou interesse em dar entrevista, mas logo parou de responder aos contatos.
Dias depois, também por mensagens, a mãe confirmou que a filha tem 13 anos e considera que aquilo é um trabalho, o que pode ser indício de trabalho infantil, analisa Denise Auad, da comissão dos direitos da criança e do adolescente da OAB SP.
A mãe disse ainda que a menina "tira um bom dinheiro no digital", sem informar valores. E que os pais preferem deixar o montante guardado, para que a filha administre melhor, no futuro.