Roseana Murray é aplaudida ao ter alta de hospital, no Rio

Por redação com O Globo 18/04/2024 19h07
Por redação com O Globo 18/04/2024 19h07
Roseana Murray é aplaudida ao ter alta de hospital, no Rio
Roseana Murray é aplaudida ao sair do hospital - Foto: Gabriel de Paiva

A escritora Roseana Murray, de 73 anos, teve alta na manhã desta quinta-feira no Hospital estadual Alberto Torres, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, data em que se comemora o Dia Nacional do Livro Infantil. Ela, que passou 13 dias internada na unidade de saúde após ser atacada por cães da raça pitbull em Saquarema, foi aplaudida pela equipe médica, por parentes e amigos.

— Ela tinha muita vontade de viver. A Roseana foi muito amorosa com todos nós e manteve uma postura muito positiva e confiante ao longo do processo de internação. A gente fica muito feliz de ver esse momento, de alta, quando o nosso paciente consegue se recuperar e deixar o hospital — disse a enfermeira Lilian Tavares, coordenadora do CTI do Heat.

A escritora trocou os curativos antes de deixar o hospital e deve retornar à unidade na próxima terça-feira para uma avaliação dos cirurgiões. Em entrevista ao sair do hospital, a escritora disse como era a relação com os vizinhos, donos dos cães, e como foi que o episódio transcorreu:

— Eles eram umas pessoas que não sei qual era a função deles, mas nunca me maltrataram. A gente tinha uma relação de "oi, vizinho!", "bom dia, vizinho"... Então, não desejo nenhum mal a eles. Essa pessoa dona dos cachorros é muito irresponsável, não sabe o alcance que isso pode ter. Eu sou contra os pitbulls, sei que o Brasil é dividido, tem gente a favor e gente contra. Mas como no Brasil nós temos milhões de leis que não são obedecidas, eu acho melhor esterilizar os pitbulls que já existem para que a raça no Brasil se extingua. Não é desejar o mal. Mas é que já estiveram aqui nesse hospital crianças... Eles (os animais) arrancam pedaços. Não é que eles te dão uma mordidinha. São três cachorros. Eles arrancavam pedaços de mim. E há uma lei da mordaça, da guia, mas não é obedecida.

A lei à qual Roseana Murray se refere é a Lei Estadual 4.597, de 2005. Ela estipula que cães das raças pitbull, fila, doberman e rotweiller só podem circular por locais públicos, como ruas, praças, jardins e parques, se conduzidos por pessoas com mais de 18 anos e que os cachorros devem usar guias com enforcador e focinheira apropriados. A lei também proíbe a permanência desses animais considerados ferozes de praias e estabelece esterilização de todos os animais da raça pitbull a partir de seis meses de idade.

Ao falar de seus projetos em entrevista, Rosena Murray contou que fará seu sarau de poesias no hospital e que planeja lançar um livro para crianças que também tiveram partes do corpo amputadas:

— Vou fazer o sarau, ele vai acontecer no hospital. Quero escrever um livro para crianças que têm falta de um membro. Já consegui a melhor ilustradora para mim, das melhores do Brasil, Mariana Massarani. Quero fazer um livro em conjunto, com opiniões das minhas amigas. Nesse caso, a gente vai fazer esse livro para crianças que podem ter perdido algum membro, mas com muito humor.

No hospital, ela relatou a expectativa que tem do retorno à rotina. O hospital ofereceu a ambulância para levá-la para casa, mas a escritora disse que quer ir de carro com o filho, ouvindo rock, o gênero musical de que ele mais gosta.

— Eu acho que a minha volta vai ser muito feliz, muito alegre. Meu marido quando ligou para o meu filho disse “a Rose morreu”, porque eu parecia morta. Mas eu estou voltando viva, estou voltando alegre — disse a escritora.

Roseana Murray escreveu um poema durante a internação no hospital. A expressão de alegria e o espírito positivo, apesar de tudo o que passou, são marcantes. O segredo disso, segundo ela, está na sua vontade de viver.

— Essa alta está me levando muito alto. É uma alegria que eu não consigo explicar. Freud diz que a gente tem a pulsão de morte, Thânatos, e a pulsão de vida, Eros. Eu sou Eros. Eu recebi muito amor e cuidado. Vou escrever um livro infantil para crianças que não tenham algum membro do corpo. O personagem, que não tem um braço, no livro, vai ter um braço mágico como o meu. Quero que as crianças pensem assim — disse, com sorriso no rosto.

Antes da alta, mais planosAndré Murray, um dos filhos da escritora — que tem mais de 100 livros publicados — contou que a mãe, planejou seus próximos projetos ainda quando estava no hospital. Em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, Roseana afirmou que considera um milagre a sua recuperação:

"Um momento da tragédia foi tão... saí de casa, os três cachorros estavam na rua e pensei: eles vão me deixar passar. Mas quando passei, eles me atacaram ao mesmo tempo. Foi muito rápido, eles praticamente teriam me destruído. Gritei por socorro, mas não passava ninguém, pois estava indo para academia às seis da manhã. A pessoa que me salvou era um rapaz que corria na praia".

O caso foi registrado na 124ª DP (Saquarema), que investiga os crimes de maus-tratos a animais, lesão corporal culposa e omissão na cautela de animais. Donos dos pitbulls, Ana Beatriz da Conceição Dantas Pinheiro, Kayky da Conceição Ribeiro dos Santos e Davidson Ribeiros dos Santos foram presos após o ataque. Eles conseguiram habeas corpus na Justiça e respondem em liberdade. Na decisão judicial, porém, o desembargador Gilmar Augusto Teixeira determina a manutenção da perda temporária da tutela dos cães, além de proibir que os três adquiram outros animais domésticos até o julgamento do mérito do habeas corpus.

Na audiência de custódia de Ana, Kayky e Davidson, três testemunhas relataram que os cães rotineiramente “saíam para a via pública sem vigilância” e “avançavam” contra pessoas. Eles também afirmaram que o portão do quintal da casa onde eles ficavam costumava ficar aberto, o que facilitava a saída dos animais e os ataques. Uma das pessoas ouvidas ainda disse que já tinha pedido à família que aumentasse o muro do terreno para evitar a fuga.

A médica veterinária que esteve no local onde os cães ficavam também participou da audiência de custódia. Ela relatou não havia canil ou focinheira. Ela também disse que “apesar de não acompanhar rotineiramente os cuidados dispensados aos cães, pode afirmar que o contexto no qual os animais estão inseridos contribui significativamente para elevar seus níveis de agressividade”.