Poeta americana Louise Glück surpreende e leva prêmio Nobel de Literatura
Escolha sinaliza pacificação após os anos mais tumultuados da história da láurea, com críticas, suspensão e assédio
A Academia Sueca anunciou que a poeta americana Louise Glück foi a vencedora do prêmio Nobel de Literatura deste ano, numa escolha surpreendente de um nome pouco cotado nas apostas para o troféu.
A escritora de 77 anos, professora da Universidade Yale, nos Estados Unidos, já venceu prêmios importantes em seu país, como o Pulitzer, o National Book Award e a Medalha Nacional de Humanidades. Seus avós eram judeus que emigraram da Hungria, e ela foi a primeira de sua família a nascer no país americano.
O comitê do Nobel apontou que Glück levou o prêmio por sua "voz poética inconfundível que, com beleza austera, torna universal a existência individual".
Para especialistas e apostadores no prêmio, era possível que um poeta ganhasse, o que não acontecia desde 2011, quando o laureado foi o sueco Tomas Tranströmer. Porém, era pouco provável que um americano levasse o prêmio mais uma vez, já que o músico Bob Dylan ganhou há apenas quatro anos.
São temáticas importantes da obra da poeta a infância, a vida familiar e o confronto entre as ilusões e a realidade. "Mas mesmo que Glück não negue a importância do fundo autobiográfico, ela não pode ser vista como uma poeta confessional", afirma o comitê sueco. "Ela busca o universal, e para isso procura inspiração nos motivos e mitos clássicos, presentes na maioria de seus trabalhos."
Glück publicou 12 coletâneas de poemas, assim como volumes de ensaios sobre poesia. Entre suas obras mais premiadas, estão "The Triumph of Achilles", "Ararat" e "The Wild Iris". Mas não há livros dela disponíveis no Brasil em tradução para o português.
A escolha parece sinalizar uma pacificação após os anos mais tumultuados da história da premiação.
Em 2017, um escândalo sexual fez tremerem as bases do comitê do Nobel e cancelou a entrega do prêmio no ano seguinte —foi a primeira vez que isso aconteceu por um motivo que não fosse uma guerra.
O pivô foi o fotógrafo Jean-Claude Arnault, condenado à prisão pelo crime de estupro após 18 mulheres o acusarem numa reportagem do jornal sueco Dagens Nyheter. Ele administrava com a esposa, a poeta Katarina Frostenson, membro da Academia Sueca, uma fundação cultural que recebia dinheiro da própria instituição.
O mesmo jornal fez a denúncia de que Arnault vazara informações sobre o vencedor do Nobel de literatura sete vezes em 20 anos. Vários integrantes da Academia se desligaram da instituição após a crise, incluindo Frostenson, levando à suspensão do prêmio por um ano.
Na cerimônia do ano passado, já com a adição de novos membros, o Nobel fez uma escolha que soou como provocação aos críticos.
Junto com Olga Tokarczuk, autora polonesa a quem foi concedido o troféu atrasado de 2018, anunciaram o nome de Peter Handke, escritor austríaco acusado de racismo e com notório posicionamento de negação do genocídio na Bósnia.
A Academia Sueca, fundada há 232 anos pelo rei da Suécia para proteger o idioma nacional, seleciona o vencedor do Nobel de literatura desde 1901. Outras instituições escandinavas selecionam os outros prêmios Nobel.
Dos 117 escritores escolhidos até hoje, apenas 16 foram mulheres, incluindo Glück. A única negra a vencer foi a americana Toni Morrison, morta no ano passado. Os únicos homens negros premiados foram o nigeriano Wole Soyinka, em 1986, e Derek Walcott, da caribenha Santa Lúcia, em 1992.
O eurocentrismo também sempre marcou o Nobel de literatura e perdura ainda hoje. A maioria dos premiados da última década veio do continente europeu.
A França lidera a lista de nacionalidades, com 11 premiados, seguida pelos Estados Unidos, com dez. O último deles havia sido Bob Dylan, outra das mais polêmicas escolhas do comitê sueco —já que o cantor e compositor é mais conhecido por suas músicas que pela autoria de livros.