Médicos estadunidenses que promoviam tratamento com ivermectina contra Covid perdem certificação
Dois médicos norte-americanos tiveram a certificação revogada pelo American Board of Internal Medicine (Abim), uma entidade semelhante ao Conselho Federal de Medicina (CFM) no Brasil, por serem apontados como lideranças de uma organização que promove a ivermectina como tratamento contra a COVID-19.
Pierre Kory, MD, não é mais certificado em medicina intensiva, doenças pulmonares e medicina interna, segundo o site da ABIM. Paul Ellis Marik, MD, também não é mais certificado em medicina intensiva ou medicina interna. Marik é o diretor científico e Kory presidente emérito da Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC), um grupo fundado pela dupla em março de 2020.
A entidade ganhou notoriedade durante o auge da pandemia por defender a ivermectina como tratamento para a COVID-19.
Atualmente, a FLCCC defende regimes de suplementos para tratar “lesões causadas por vacinas” e oferece tratamentos para a doença de Lyme - infecção bacteriana transmitida por carrapatos de diversas espécies, capaz de provocar lesões na pele, nas articulações, no coração e no sistema nervoso central.
Estudos que pretendiam mostrar benefício do ivermectina foram posteriormente associados a erros, e descobriu-se que alguns se baseavam em pesquisas potencialmente fraudulentas. A ABIM não quis comentar quando questionada pelo Medscape Medical News, entidade global que divulga notícias médicas, sobre sua ação.
No site, o termo “revogado” indica a “perda de certificação devido a ação disciplinar para a qual a ABIM determinou que a conduta subjacente à sanção não garante um caminho definido para restauração da certificação no momento da sanção disciplinar”.
Em um comunicado enviado ao site Medscape Medical News, Kory e Marik disseram “que esta decisão representa uma mudança perigosa nos princípios fundamentais do discurso médico e do debate científico que historicamente têm sido a base das associações de educação médica”.
A FLCCC afirmou no comunicado que, juntamente com Kory e Marik, estão “avaliando opções para contestar essas decisões”.
AÇÃO DISCIPLINAR
Kory e Marik explicaram que foram notificados em maio de 2022 de que enfrentavam uma possível ação disciplinar da Abim. Um comitê da Abim recomendou a revogação em julho de 2023, dizendo que os dois homens estavam divulgando “informações médicas falsas ou imprecisas”, segundo a FLCCC. Kory e Marik perderam um recurso.
Em declaração de 2023, Kory e Marik chamaram a ação da Abim de “ataque à liberdade de expressão”.
“Esta não é uma questão de liberdade de expressão”, disseram Arthur Caplan, PhD, os doutores William F. e Virginia Connolly Mitty - professores de bioética no Departamento de Saúde Populacional da NYU Grossman School of Medicine, Nova York.
“Você tem direito à liberdade de expressão, mas não tem o direito de exercer a profissão fora dos limites do padrão de atendimento”, comentaram. “Isso significa que a profissão está rejeitando aqueles “que estão envolvidos em coisas que prejudicam os pacientes ou que atrasam a obtenção de tratamentos aceitos”, disse Caplan.
Wendy Parmet, JD, distinguished University Professor of Law da Northeastern University School of Public Policy and Urban Affairs, Boston, disse que a desinformação espalhada pelos médicos é especialmente prejudicial porque vem com um ar de credibilidade.
“Você quer deixar espaço suficiente para discurso e discussão dentro da profissão e não quer que o conselho imponha uma ortodoxia estreita e rígida”, disse Wendy. Mas nos casos em que as pessoas estão “vendendo informações que estão muito fora do consenso” ou estão “lucrando com isso, a profissão não tomar nenhuma ação, isso é, penso eu, prejudicial também para a confiança na profissão”, acrescentou.
Ela não ficou surpresa que Kory e Marik lutassem para manter a certificação. “A certificação do conselho é algo importante e que vale muito a pena ter”, disse ela. "Perdê-lo não é trivial."
Kory, que é licenciado na Califórnia, Nova York e Wisconsin, “não exige a certificação para sua prática independente, mas está avaliando os próximos passos com advogados”, de acordo com o comunicado da FLCCC. Marik, cuja licença médica na Virgínia expirou em 2022, “não está mais tratando pacientes e dedicou seu tempo e esforços à Aliança FLCCC”, disse o comunicado.