Nasa encontra planeta com vestígios de vida alienígena
Uma descoberta épica acaba de ser feita pela missão K2, a segunda fase de operações do satélite Kepler, da Nasa. Seria apenas mais um planeta potencialmente similar à Terra, como tantos que já foram anunciados nos últimos anos, não fosse por um detalhe: ele é o primeiro a ser encontrado que permitirá a busca efetiva por sinais de vida em sua atmosfera.
Você pode se perguntar: mas por que os outros não permitiam isso? Qual o problema com os oito mundos recentemente anunciados, ou o Kepler-186f, que fez manchetes em 2014? Em essência, esses planetas estavam distantes demais para permitir o posterior estudo de suas atmosferas.
Esse não é o caso do planeta que recebeu a designação EPIC 201367065 d. Ele tem um diâmetro cerca de 50% maior que o da Terra e completa uma volta em torno de sua estrela-mãe a cada 44,6 dias terrestres. Os dados da missão K2 revelaram a presença de outros dois planetas, um com cerca de 2,1 vezes o diâmetro terrestre, completando uma volta em torno da estrela a cada 10 dias, e o outro com 1,7 vez o diâmetro da Terra e período orbital de 24,6 dias.
A grande vantagem, contudo, é a distância que a estrela EPIC 201367065 guarda de nós — cerca de 150 anos-luz. Não é que esteja “logo ali”, como diria o outro, mas é perto o suficiente para que possamos aplicar a tecnologia atual para estudar diretamente a atmosfera desse mundo. E isso, por sua vez, pode carregar pistas da existência de vida.
A BENESSE DO TRÂNSITO
Hoje em dia, é muito difícil observar diretamente a luz que emana de um planeta fora do Sistema Solar. Algumas câmeras especiais já conseguem fotografar planetas gigantes em órbitas longas em torno de seus sóis, mas isso ainda não é possível para planetas pequenos e rochosos em órbitas suficientemente próximas a ponto de permitir que a água se mantenha em estado líquido na superfície — condição aparentemente essencial para o surgimento e a manutenção da vida.
Então, o único meio de estudar a atmosfera desses mundos é nos casos em que eles “transitam” à frente de suas estrelas, com relação ao nosso campo de visão. Assim, parte da luz da estrela atravessa de raspão a atmosfera do planeta e segue até nós, carregando consigo uma “assinatura” da composição do ar.
Pois bem. O satélite Kepler detecta planetas justamente medindo as sutis reduções de brilho das estrelas conforme eles passam à frente delas. Por um lado, isso limita brutalmente a quantidade de planetas que podemos detectar, pois exige que o sistema esteja alinhado de tal forma que esses mini-eclipses sejam visíveis daqui. (Estima-se que apenas 5% dos sistemas planetários estejam num alinhamento favorável.) Por outro lado, os planetas que descobrimos já são alvos naturais para estudos de espectroscopia, a análise da tal “assinatura” na luz que passou de raspão pela atmosfera.
Acontece que a missão original do Kepler não era buscar mundos que pudessem ser estudados assim. Quando ele foi projetado e lançado, a quantidade de planetas conhecidos ainda não era tão expressiva, de forma que o objetivo principal do satélite era obter descobertas suficientes para formular um censo da distribuição dos planetas pelo Universo. Para isso, a Nasa o apontou para uma única região do céu, um pequeno cantinho que representa apenas 0,25% do total da abóbada celeste, mas que tinha grande concentração de estrelas. Ele passou quatro anos monitorando cerca de 150 mil estrelas ininterruptamente. O sucesso foi notável. O Kepler já descobriu sozinho mais planetas que todos os outros esforços e projetos que vieram antes dele. Mas um efeito colateral indesejável é que a maioria desses planetas está a uma distância grande demais para permitir esses estudos atmosféricos.
Na missão K2, contudo, a história é outra. Em tese, ela nem deveria existir. Sua formulação foi motivada por um defeito no satélite Kepler, que impediu que ele permanecesse mantendo seu apontamento preciso exigido pela missão original. A Nasa acabou resolvendo a questão usando a própria luz solar como um “apoio” extra para manter o telescópio espacial firmemente apontado, mas com isso é preciso manter a espaçonave sempre alinhada com o Sol, o que significa que o Kepler, conforme avança em sua órbita, agora troca periodicamente a região do céu em foco. São apenas 80 dias para cada região do céu escolhida. Além disso, a precisão das observações diminuiu, de forma que agora a prioridade são estrelas mais próximas — qualidade, em vez de quantidade. Na prática, agora começamos a buscar de fato planetas que iremos estudar a fundo nos próximos anos.
O que nos leva à estrela EPIC 201367065. Ela é uma anã vermelha, um astro com cerca de metade do diâmetro do nosso Sol. Menos quente e luminosa, portanto, o que significa que a chamada zona habitável fica bem mais perto dela do que acontece no Sistema Solar. Segundo os cálculos dos astrônomos, o terceiro planeta do sistema recebe aproximadamente 50% mais radiação de sua estrela que a Terra ganha do Sol. Se isso se traduz num planeta com temperatura amena, como o nosso, ou num inferno escaldante, como Vênus, depende basicamente da composição e da densidade da atmosfera desse mundo misterioso.
O JOGO JÁ COMEÇOU
E aí é que entra a parte interessante. Em vez de simplesmente especular sobre isso, os astrônomos já podem colocar a mão na massa. E não só com o planeta possivelmente habitável, mas com os outros dois, ligeiramente maiores, nas órbitas mais internas. Seriam eles mais parecidos com versões miniaturizadas de Netuno, o menor dos gigantes gasosos do nosso Sistema Solar, ou estão mais para superterras, mundos essencialmente rochosos? Os cientistas apontam em seu artigo, submetido para publicação no “Astrophysical Journal”, que o Telescópio Espacial Hubble seria capaz de analisar o espectro e verificar a presença de grandes invólucros gasosos de hidrogênio nesses planetas, caso eles não tenham grandes coberturas de nuvens na alta atmosfera.
E a coisa vai ficar melhor ainda a partir de 2018, quando a Nasa lançar ao espaço o Telescópio Espacial James Webb. Ele será capaz de detectar dados espectrais correspondentes a uma atmosfera similar à terrestre. Por exemplo, se um desses mundos tiver uma atmosfera como a nossa, onde predomina o nitrogênio, nós saberemos. Se ela contiver grandes quantidades de dióxido de carbono, como é o caso de Vênus, também.
Isso sem falar na medida mais natural a ser tomada desse sistema planetário — a observação dos efeitos gravitacionais que os planetas exercem sobre a estrela-mãe. Com as tecnologias atuais, já seríamos capazes de detectar o bamboleio gravitacional realizado pela estrela conforme ela é atraída para lá e para cá pelos planetas girando em torno dela. E, com isso, saberíamos suas massas. Juntando essa nova informação aos diâmetros, já medidos pelo Kepler, conheceríamos a densidade. E, a partir dela, poderíamos inferir se estão mais para planetas como a Terra ou mundos gasosos, muito menos densos.
“Ao nos permitir medir as massas e as condições atmosféricas de três planetas pequenos num único sistema, a EPIC 201367065 representa uma oportunidade empolgante para o teste de teorias de formação e evolução planetária num único laboratório extra-solar”, escrevem os cientistas encabeçados por Ian Crossfield, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.
Os astrônomos já têm o caminho todo mapeado. A ideia é que o K2, assim como seu sucessor, o satélite TESS, que deve ser lançado em 2017, descubra mais alvos promissores, como os do sistema EPIC 201367065. Quando o James Webb for ao espaço, em 2018, terá uma lista considerável de planetas para estudar — potencialmente centenas deles. Todos interessantes, mas obviamente nem todos tão bons para a vida quanto a Terra. Contudo, se, de toda essa rica amostra de mundos, apenas um tiver uma atmosfera rica em oxigênio sem que esse gás possa ter sido produzido em quantidade apreciável por processos não-biológicos (como é o caso do nosso planeta), já teremos a certeza de que não estamos sós no Universo.
Difícil imaginar uma época mais empolgante que esta em toda a história da espécie humana. Quem viver verá.
Você pode se perguntar: mas por que os outros não permitiam isso? Qual o problema com os oito mundos recentemente anunciados, ou o Kepler-186f, que fez manchetes em 2014? Em essência, esses planetas estavam distantes demais para permitir o posterior estudo de suas atmosferas.
Esse não é o caso do planeta que recebeu a designação EPIC 201367065 d. Ele tem um diâmetro cerca de 50% maior que o da Terra e completa uma volta em torno de sua estrela-mãe a cada 44,6 dias terrestres. Os dados da missão K2 revelaram a presença de outros dois planetas, um com cerca de 2,1 vezes o diâmetro terrestre, completando uma volta em torno da estrela a cada 10 dias, e o outro com 1,7 vez o diâmetro da Terra e período orbital de 24,6 dias.
A grande vantagem, contudo, é a distância que a estrela EPIC 201367065 guarda de nós — cerca de 150 anos-luz. Não é que esteja “logo ali”, como diria o outro, mas é perto o suficiente para que possamos aplicar a tecnologia atual para estudar diretamente a atmosfera desse mundo. E isso, por sua vez, pode carregar pistas da existência de vida.
A BENESSE DO TRÂNSITO
Hoje em dia, é muito difícil observar diretamente a luz que emana de um planeta fora do Sistema Solar. Algumas câmeras especiais já conseguem fotografar planetas gigantes em órbitas longas em torno de seus sóis, mas isso ainda não é possível para planetas pequenos e rochosos em órbitas suficientemente próximas a ponto de permitir que a água se mantenha em estado líquido na superfície — condição aparentemente essencial para o surgimento e a manutenção da vida.
Então, o único meio de estudar a atmosfera desses mundos é nos casos em que eles “transitam” à frente de suas estrelas, com relação ao nosso campo de visão. Assim, parte da luz da estrela atravessa de raspão a atmosfera do planeta e segue até nós, carregando consigo uma “assinatura” da composição do ar.
Pois bem. O satélite Kepler detecta planetas justamente medindo as sutis reduções de brilho das estrelas conforme eles passam à frente delas. Por um lado, isso limita brutalmente a quantidade de planetas que podemos detectar, pois exige que o sistema esteja alinhado de tal forma que esses mini-eclipses sejam visíveis daqui. (Estima-se que apenas 5% dos sistemas planetários estejam num alinhamento favorável.) Por outro lado, os planetas que descobrimos já são alvos naturais para estudos de espectroscopia, a análise da tal “assinatura” na luz que passou de raspão pela atmosfera.
Acontece que a missão original do Kepler não era buscar mundos que pudessem ser estudados assim. Quando ele foi projetado e lançado, a quantidade de planetas conhecidos ainda não era tão expressiva, de forma que o objetivo principal do satélite era obter descobertas suficientes para formular um censo da distribuição dos planetas pelo Universo. Para isso, a Nasa o apontou para uma única região do céu, um pequeno cantinho que representa apenas 0,25% do total da abóbada celeste, mas que tinha grande concentração de estrelas. Ele passou quatro anos monitorando cerca de 150 mil estrelas ininterruptamente. O sucesso foi notável. O Kepler já descobriu sozinho mais planetas que todos os outros esforços e projetos que vieram antes dele. Mas um efeito colateral indesejável é que a maioria desses planetas está a uma distância grande demais para permitir esses estudos atmosféricos.
Na missão K2, contudo, a história é outra. Em tese, ela nem deveria existir. Sua formulação foi motivada por um defeito no satélite Kepler, que impediu que ele permanecesse mantendo seu apontamento preciso exigido pela missão original. A Nasa acabou resolvendo a questão usando a própria luz solar como um “apoio” extra para manter o telescópio espacial firmemente apontado, mas com isso é preciso manter a espaçonave sempre alinhada com o Sol, o que significa que o Kepler, conforme avança em sua órbita, agora troca periodicamente a região do céu em foco. São apenas 80 dias para cada região do céu escolhida. Além disso, a precisão das observações diminuiu, de forma que agora a prioridade são estrelas mais próximas — qualidade, em vez de quantidade. Na prática, agora começamos a buscar de fato planetas que iremos estudar a fundo nos próximos anos.
O que nos leva à estrela EPIC 201367065. Ela é uma anã vermelha, um astro com cerca de metade do diâmetro do nosso Sol. Menos quente e luminosa, portanto, o que significa que a chamada zona habitável fica bem mais perto dela do que acontece no Sistema Solar. Segundo os cálculos dos astrônomos, o terceiro planeta do sistema recebe aproximadamente 50% mais radiação de sua estrela que a Terra ganha do Sol. Se isso se traduz num planeta com temperatura amena, como o nosso, ou num inferno escaldante, como Vênus, depende basicamente da composição e da densidade da atmosfera desse mundo misterioso.
O JOGO JÁ COMEÇOU
E aí é que entra a parte interessante. Em vez de simplesmente especular sobre isso, os astrônomos já podem colocar a mão na massa. E não só com o planeta possivelmente habitável, mas com os outros dois, ligeiramente maiores, nas órbitas mais internas. Seriam eles mais parecidos com versões miniaturizadas de Netuno, o menor dos gigantes gasosos do nosso Sistema Solar, ou estão mais para superterras, mundos essencialmente rochosos? Os cientistas apontam em seu artigo, submetido para publicação no “Astrophysical Journal”, que o Telescópio Espacial Hubble seria capaz de analisar o espectro e verificar a presença de grandes invólucros gasosos de hidrogênio nesses planetas, caso eles não tenham grandes coberturas de nuvens na alta atmosfera.
E a coisa vai ficar melhor ainda a partir de 2018, quando a Nasa lançar ao espaço o Telescópio Espacial James Webb. Ele será capaz de detectar dados espectrais correspondentes a uma atmosfera similar à terrestre. Por exemplo, se um desses mundos tiver uma atmosfera como a nossa, onde predomina o nitrogênio, nós saberemos. Se ela contiver grandes quantidades de dióxido de carbono, como é o caso de Vênus, também.
Isso sem falar na medida mais natural a ser tomada desse sistema planetário — a observação dos efeitos gravitacionais que os planetas exercem sobre a estrela-mãe. Com as tecnologias atuais, já seríamos capazes de detectar o bamboleio gravitacional realizado pela estrela conforme ela é atraída para lá e para cá pelos planetas girando em torno dela. E, com isso, saberíamos suas massas. Juntando essa nova informação aos diâmetros, já medidos pelo Kepler, conheceríamos a densidade. E, a partir dela, poderíamos inferir se estão mais para planetas como a Terra ou mundos gasosos, muito menos densos.
“Ao nos permitir medir as massas e as condições atmosféricas de três planetas pequenos num único sistema, a EPIC 201367065 representa uma oportunidade empolgante para o teste de teorias de formação e evolução planetária num único laboratório extra-solar”, escrevem os cientistas encabeçados por Ian Crossfield, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.
Os astrônomos já têm o caminho todo mapeado. A ideia é que o K2, assim como seu sucessor, o satélite TESS, que deve ser lançado em 2017, descubra mais alvos promissores, como os do sistema EPIC 201367065. Quando o James Webb for ao espaço, em 2018, terá uma lista considerável de planetas para estudar — potencialmente centenas deles. Todos interessantes, mas obviamente nem todos tão bons para a vida quanto a Terra. Contudo, se, de toda essa rica amostra de mundos, apenas um tiver uma atmosfera rica em oxigênio sem que esse gás possa ter sido produzido em quantidade apreciável por processos não-biológicos (como é o caso do nosso planeta), já teremos a certeza de que não estamos sós no Universo.
Difícil imaginar uma época mais empolgante que esta em toda a história da espécie humana. Quem viver verá.
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