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“Ele pode não te bater, mas...” – Sobre relações abusivas e violência psicológica

24/11/2016 10h10
24/11/2016 10h10
“Ele pode não te bater, mas...” – Sobre relações abusivas e violência psicológica
 “#Elepodenãotebater. Mas faz você pensar muito bem antes de falar com ele por medo dele ficar irritado”.

“#Elepodenãotebater. Mas não deixa você sair com suas amigas sem ele”.

#Elepodenãotebater. Ele só reclama da sua barriga depois que vocês tiveram filhos e diz para você emagrecer antes que ele arrume uma menina de 15 anos mais bonita".

"#Elepodenãotebater. Mas ameaça se matar toda vez que você fala em terminar ou dar um tempo".

"#Elepodenãotebater. Mas ele não para de te perguntar sobre seus relacionamentos passados e julgar você por qualquer coisa que responder".

 “Elepodenãotebater. Mas arremessa o telefone na parede porque você questionou sobre alguma coisa”.

“Elepodenãotebater. Mas faz você acreditar que não era boa o suficiente em um ou mais aspectos da sua vida.

*(Frases publicadas em redes sociais durante a campanha “#Maybehedoesn'thityou", "#Elepodenãotebater", traduzida no Brasil que trouxeram situações impactantes do dia-a-dia de relacionamentos abusivos.)

 

Quando falamos em violência contra a mulher qual a primeira coisa que vem à cabeça? Certamente sua resposta se baseará em murros, puxões de cabelo, apertos nos braços que deixam marcas roxas, chutes, pontapés, entre outras agressões associadas ao contato físico. No entanto, existe uma forma de violência que deixa marcas bem mais profundas do que a física e que não encontra solução em analgésicos e demais remédios: a violência psicológica.

Violência psicológica é a forma mais subjetiva de agressão contra a mulher. E justamente devido sua subjetividade, ela é tão difícil de ser percebida pela pessoa agredida. Geralmente as mulheres que são vítimas de violência psicológica tendem a acreditar que aquilo que o companheiro falou – e que a magoou – não é uma forma de agressão, que ele não falou aquilo por mal ou que relacionamentos tem dessas coisas, romantizando o que não é romântico e naturalizando algo que não é natural.

A violência psicológica é um fenômeno que geralmente antecede a agressão física, sendo sua principal característica a destruição da autoestima da vítima. Segundo a Organização Mundial de Saúde, violência psicológica é definida por:

Qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação (2006).

 Geralmente a violência psicológica tem início ainda no namoro, porém de forma tão sutil e “apaixonada” que a vítima não percebe que está em uma relação abusiva e tende a se moldar ao comportamento do parceiro: passa a vestir-se da forma que o outro gosta/exige; deixa algumas amizades de lado pois o parceiro não gosta delas; abandona aquele emprego pois lá tinha muitos homens; não consegue ter privacidade pois o outro tem acesso a seu celular ou notebook; a vítima evita reclamar de algo que o outro tenha feito pois prefere evitar que ele se altere e a envergonhe na frente das demais pessoas, entre tantas outras situações.

Com o passar do tempo a situação agrava. Aquele ciúme da época do namoro que vinha mascarado de zelo perde o controle e a vítima passa a ouvir xingamentos que atentam contra seu caráter; aquele emprego que ela pediu demissão não foi o único e a essa altura a vítima passa a concordar que “não serve para nada e que é burra”; já não acredita que seja uma boa esposa, boa mãe, boa amiga ou boa para qualquer coisa, e que precisa desse companheiro para ser alguém na vida, pois é isso que o outro a faz acreditar.

Em um relacionamento abusivo, por mais que no início da discussão a vítima acredite que tenha razão, ao final dela a situação tende a inverter e ela sente-se culpada por ter “provocado” a briga, acreditando ser realmente “louca” como o outro sugere. A pessoa vítima de violência psicológica muitas vezes evita contar situações de seu relacionamento para pessoas próximas pois sente vergonha por estar submetida a esse tipo de relação em que ela sabe que não é feliz, porém sente-se presa e não consegue desvencilhar-se.

Outra característica que pode estar dentro de uma relação abusiva é a chantagem. O outro pode tentar manipular o comportamento da vítima através de ameaças, tais como: publicar fotos íntimas em redes sociais, pegar a guarda dos filhos, ameaçar matar-se caso o relacionamento acabe ou até mesmo matar a parceira e seus familiares.

A principal característica da violência psicológica é o dano psicológico. As mulheres vítimas de violência psicológica passam a apresentar graves déficits na autoestima ao mesmo passo em que se sentem impotentes para a resolução do problema. O abusador passa a ter total controle da situação e sempre que a vítima pensa que aquilo não está correto, em seguida tem pensamentos de que é a culpada por todos aqueles problemas do relacionamento, em um círculo vicioso em que acredita que “se eu não tivesse agido assim ele não teria feito isso”.

Danos psicológicos oriundos de violência psicológica podem resultar em depressão e até mesmo suicídios. Então, se você enquanto fazia a leitura desse breve texto identificou características do seu relacionamento, busque ajuda, não se acostume com o que não a faz feliz. Se você conhece alguém que vive em um relacionamento abusivo, faça o mesmo pelo próximo. E se você se identificou enquanto abusador, você também precisa de ajuda.

O acompanhamento psicológico é fundamental para que a mulher vítima de violência possa ser acolhida e ouvida a fim de que esta possa recuperar e fortalecer a autoestima e desenvolver habilidades para lidar com a situação vivida e seguir adiante. No entanto, o apoio psicológico não é o único que pode estar presente nesse processo, o apoio às mulheres vítimas de violência deve se dar de forma multidisciplinar. Além de psicólogo, é preciso contar com apoio jurídico e de toda a rede de acolhimento e atendimento como Centros de Referência da Mulher, Juizados Especializados em Violência Doméstica, Delegacias da Mulher, serviços de saúde e etc.

Lembre-se: quem silencia torna-se cúmplice. Denuncie.

 

Referências:

Lei Maria da Penha. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm

 
                                                                                                                                                                                      
                                                                                                                                                                                          

Renata Lopes Santos

Psicóloga Clínica Comportamental

CRP 15/3296

Além da Caixa

O Além da Caixa é um espaço para a discussão dos mais diversificados temas sob a ótica da psicologia do comportamento. De maneira direta e com uma linguagem clara falaremos ao público em geral, mas sem destoar dos princípios da Psicologia Científica.
Seus responsáveis são os psicólogos comportamentais Cinthia Ferreira CRP 15/3287, Jacinto Neto CRP 15/3274, Jackelline Lima CRP 15/3275 e Renata Lopes CRP 15/3296, graduados em Psicologia pela Universidade Federal de Alagoas e pós graduação em Análise do Comportamento.
Endereço: Clínica Vida Bella - Av. Ceci Cunha, 255, Alto do Cruzeiro - Arapiraca/AL.
Telefone para contato: 35211565 / 96180666

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